Quando o Estado toca na Escritura: riscos espirituais e pastorais para o católico

Editorial

O Projeto de Lei 4606/2019 que pretende proibir alterações, adaptações ou versões da Bíblia Sagrada pode parecer, à primeira vista, uma defesa da fé cristã. Muitos fiéis, movidos por um zelo sincero, veem na proposta uma barreira contra distorções ideológicas e abusos do texto bíblico. No entanto, para um católico apostólico romano, o problema é mais profundo e exige discernimento espiritual. Nem tudo o que se apresenta como “proteção” da Bíblia serve, de fato, à fé. Quando o Estado assume o papel de guardião de um texto sagrado, desloca-se uma realidade que pertence à Igreja, à Tradição e ao Magistério, abrindo um campo perigoso de confusão espiritual, jurídica e pastoral.

O primeiro risco, à luz do nosso pilar doutrinal, é a ruptura da compreensão católica da Revelação. Para a Igreja, a Palavra de Deus não se resume ao texto escrito da Bíblia, mas vive inseparavelmente da Tradição Apostólica e do Magistério. A Bíblia não caiu pronta do céu: foi confiada à Igreja, que a reconheceu, preservou, traduziu e interpretou ao longo dos séculos. Quando uma lei civil pretende “congelar” o texto bíblico, surge uma pergunta inevitável: qual Bíblia? Qual cânon? Qual tradução? A simples tentativa de responder a isso já coloca o Estado em um território que não lhe compete, pois toca diretamente na autoridade da Igreja enquanto guardiã da Revelação.

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No pilar pastoral, os riscos se tornam ainda mais concretos. A vida da Igreja depende da possibilidade de tradução, adaptação linguística e atualização pastoral da Sagrada Escritura, sempre em fidelidade ao sentido original. É graças a esse trabalho que o Evangelho chega a povos indígenas, comunidades ribeirinhas, fiéis simples, crianças e pessoas com limitações de leitura. Uma legislação rígida pode gerar medo, insegurança jurídica e até perseguição indireta a iniciativas legítimas de evangelização. Aquilo que deveria facilitar o encontro com Cristo pode se transformar em obstáculo, criando um clima de vigilância e suspeita sobre a própria missão evangelizadora da Igreja.

Já no pilar espiritual, o perigo é ainda mais sutil. Quando se transfere ao poder político a responsabilidade de “proteger” a Palavra de Deus, corre-se o risco de alimentar uma falsa segurança espiritual. A história da Igreja mostra que a fé não é preservada por decretos, mas pela conversão dos corações, pela vida sacramental e pela fidelidade ao ensinamento de Cristo. Leis não combatem heresias, não curam desvios doutrinais e não libertam o homem do pecado. Pelo contrário: podem criar a ilusão de que a fé está segura enquanto, internamente, o rebanho permanece vulnerável à confusão, ao relativismo e ao esvaziamento espiritual.

É importante afirmar, com clareza e caridade, que essa análise não nasce do desprezo às demais denominações cristãs ou religiões. Cada tradição possui sua forma própria de relação com o texto sagrado, e isso deve ser respeitado. Contudo, para o católico, a ingerência do Estado nesse campo representa uma inversão perigosa: a política passa a legislar sobre aquilo que pertence à ordem da fé. Hoje é a Bíblia. Amanhã, pode ser a liturgia, a moral ou a doutrina. A história ensina que toda vez que o poder civil tenta regular o sagrado, o resultado é conflito, confusão e, muitas vezes, perseguição velada.

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A consulta pública sobre o apoio da população ao PL 4606/2019 está aberta no site do Senado Federal e nossa indicação é muito clara, no sentido de que o católico deve votar “NÃO”. Para votar, clique aqui!

Como Portal Cura e Libertação, nossa posição é de alerta e discernimento. Não se cura a sociedade sacralizando leis, mas evangelizando pessoas. Não se liberta a fé por imposição jurídica, mas pela fidelidade à Igreja, pela formação sólida dos fiéis e pela vida no Espírito Santo. O católico é chamado a amar e defender a Sagrada Escritura, sim, mas sempre dentro da ordem correta: sob a autoridade da Igreja, em comunhão com a Tradição e guiado pelo Magistério. Fora disso, mesmo boas intenções podem abrir brechas que, espiritualmente, custam caro.

Rodrigo Cardoso, Editor do Portal Cura e Libertação

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