Os 7 períodos históricos do Exorcismo na Igreja Católica

A história dos exorcismos na Igreja Católica ainda não foi escrita. Esta afirmação, dada por Padre Gabriele Amorth em um de seus livros[1], mostra que existem teólogos ensinando que o exorcismo na Igreja já teve seu desfecho histórico concluído. O teólogo Achille M. Triacca afirma em um de seus escritos que “a história do exorcismo, nas suas várias definições já foi escrita”. [2]

O professor J. B Russel e o alemão A. Franz também escreveram sobre o assunto, mas ainda é pouco em face da grandeza e da necessidade do tema para a Igreja. [3]

  • 1º período histórico: na vida de Cristo e dos apóstolos

Jesus, desde cedo, combateu e venceu Satanás na sua atividade de tentador. [4] O próprio Jesus fala da sua missão em Lc 11, 20 , em que afirma que veio “…para destruir o reino do demônio e instaurar o reino de Deus”. Esta afirmação do Senhor deve ser levada em consideração à medida em que são palavras do Senhor, o Rei dos reis. Suas próprias palavras devem ser levadas em conta. Cristo expulsou muitos demônios em sua vida pública e os próprios espíritos imundos o reconheciam como Senhor (Cf. Mt 5, 1-20).

E os apóstolos expulsaram os demônios junto de Jesus e após a sua ressurreição, além de insistir na luta contra o demônio.[5]

  • 2º período histórico: nos três primeiros séculos

Todos os cristãos exerciam o poder de expulsar os demônios em nome de Cristo.

“Cristo nasceu por vontade do Pai para salvação dos que crêem e ruína dos demônios. Podeis convencer-vos mediante o que vedes com os vossos olhos. Em todo o universo e na vossa cidade [Roma] existem numerosos endemoninhados que os outros exorcistas, encantadores e magos, não conseguiram curar. Muitos de nós cristãos, pelo contrário, ordenando-lhes nome de Jesus Cristo, crucificado sob Pôncio Pilatos, curamo-los reduzindo à impotência dos demônios que os possuíam” [6].

E Cipriano afirma o poder dos exorcismos:

“Vem ouvir com os teus próprios ouvidos os demônios, vem vê-los com os teus olhos nos momentos em que, cedendo às nossas esconjuras, aos nossos flagelos espirituais e à tortura das nossas palavras, abandonam os corpos daqueles de quem se tinham apoderado”.[7]

Orígenes explica-nos onde reside a força dos exorcismos:

“A força do exorcismo reside no nome de Jesus que é pronunciado enquanto, ao mesmo tempo, se anunciam os fatos relativos à sua vida”.[8]

Os primeiros cristãos tinham a firme convicção de que o paganismo era obra do demônio e sempre se mostrou eficaz a necessidade de exorcizar os indivíduos.

  • 3º período histórico: do século III ao século VI

Grandes evoluções marcaram a Igreja neste tempo, inclusive em relação aos exorcismos. Constantino e Teodósio, com suas vitórias, quase deixaram a impressão de que o paganismo foi derrotado pelo cristianismo. Mas as invasões bárbaras são interpretadas pelos padres da Igreja como advento de um novo paganismo, não menos necessitado de ser exorcizado do que o primeiro. Surge a figura de São Martinho de Tours, que, além de ter precedido São Bento na fundação do monarquismo ocidental, é um dos grandes Apóstolos da conversão dos bárbaros e conhecido como grande exorcista.

O surgimento do monarquismo dá mais impulso à atividade exorcística. Os primeiros monges, a citar, Santo Antão, Pacómio, Hilarião, foram para o deserto para combater o demônio, e não para fugirem do mundo. Segundo a tradição, o demônio tem no deserto sua morada preferida. Os monges elegem sua missão principal a de lutar para libertar a humanidade dos assaltos de Satanás. Embora todos os cristãos pudessem expulsar o demônio em nome de Cristo, aqueles que se dedicavam à oração e ao jejum – conforme o ensinamento evangélico – tornaram-se protagonistas dessa ação. Quanto mais dura era a vida dos monges, mais fácil tornava-se a tarefa de expulsar Satanás. No século IV, destacam-se dois mártires: Marcelino e Pedro. Depois dos apóstolos,  Pedro é o mais antigo exorcista mártir de que se tem notícia e era muito famoso nesta época. Neste tempo, promulgam-se as primeiras disposições canônicas na Igreja Ocidental e os exorcistas são nomeados entre as ordens menores sob o pontificado do Papa Silvestre. A ordem do exorcistado[9] será abolida com o Vaticano II na Igreja Católica.

No ano 416, o Papa Inocêncio I estabelece que os exorcismos apenas podem ser administrados sob autorização episcopal. A partir daqui, passa-se a chamar exorcismo o sacramental administrado pelo bispo ou pelo sacerdote por ele autorizado e os fiéis leigos passam a realizar preces de libertação. A finalidade será sempre a mesma: expulsar os demônios.

  • 4º período histórico: do século VII ao século XII

Neste período, a Igreja passava pelo amadurecimento em relação aos exorcismos. Havia uma “escola de preparação”, na qual os exorcistas mais experientes eram acompanhados de vários padres jovens que podiam assumir a tarefa de exorcizar, caso fosse necessário.

A fórmula para ordenação do exorcista aparece pela primeira vez nos Statuta Ecclesiae Antiquae, do século VI. Muitas fórmulas valiosas para exorcismo são criadas e algumas são utilizadas até hoje. A prática dos exorcismos na Igreja, neste tempo, adquiriu um bom equilíbrio a ponto de se poder falar numa verdadeira pastoral de libertação.

  • 5º período histórico: do século XIII ao século XV

É um período muito triste para a Igreja. Muitas heresias, contestações anti-clericais e anti-eclesiáticas. A Europa é tomada por guerras e muitas mulheres são queimadas na fogueira como bruxas. Como tinham envolvimento com práticas ocultas, necessitavam ser exorcizadas, mas foram queimadas na fogueira. Em 1252, o Papa Inocêncio IV autoriza a tortura contra os hereges, e em 1326, o Papa João XXII autoriza pela primeira vez a inquisição contra as bruxas. Surge a mania de demonizar todas as coisas, porém, ao invés de levar a um número maior de exorcismos, aconteceu uma grande destruição. A mentalidade da época deve ser levada em consideração, não significando que deva ser aprovada ou endossada.

  • 6º período histórico: Do século XVI ao século XVII

Neste tempo, os exorcismos cederam lugar às perseguições. Os homens passaram a ser perseguidos e mortos, e mesmo onde se faziam exorcismos, acontecia perseguições. Onde se realizou exorcismos, deu-se lugar à sensibilidade pastoral, como no caso da irmã Joana (1559-1620), das irmãs negras de Mons, na França. Esta freira há muitos anos tinha feito um pacto com o demônio, e pelas normas da época, devia ser entregue à Inquisição, para ser condenada. Mas o arcebispo de Cambrai, Monsenhor Luís de Berlaymont, ordenou que a freira fosse exorcizada, e não processada. Seu processo de libertação durou quase um ano, mas a sensibilidade pastoral do

Arcebispo salvou a freira. Tempo extremamente difícil para a Igreja, onde a caça as bruxas tornou-se corriqueira.[10]

  • 7º período histórico: Do século XVIII até os nossos dias

As perseguições do passado levaram a um desinteresse total pelo diabo. O demônio deixou de ser considerado como ser pessoal que atua em profundidade. O Vaticano II veio reafirmar a eterna luta da humanidade contra o demônio:

“Toda a história humana está marcada por uma luta tremenda contra as potências das trevas; luta essa que começou no princípio do mundo e está destinada a durar, como diz o Senhor, até o último dia”.[11] 

O século XX passa para um materialismo histórico, pelo ateísmo sendo ensinado livremente e pelo consumismo do mundo oriental. Na igreja, nos seminários e nas universidades pontifícias quase não se fala do demônio e tampouco dos exorcismos. Por essa razão, quando surge um caso de possessão, o fiel não sabe aonde recorrer, pois a maioria dos padres não sabe como lidar com tal situação. O Papa Pio VII era o papa prisioneiro de Napoleão. Era um grande exorcista e mesmo depois de Papa continuava a fazer exorcismos. Costumava dizer que “o ponto de partida da pastoral é o exorcismo”.

Mesmo não sendo difícil se encontrar um exorcista, há necessidade urgente de que se cuide dos possessos.

Cardeal Ugo Poletti, antigo vigário de Roma, no ano de 1986 nomeou padre Gabriele Amorth para exorcista de Roma. Na nomeação, disse a ele que  “a Igreja, desesperada, necessita de exorcistas. Há muitos possessos e ninguém se encarrega deles”.

[1] Exorcistas e Psiquiatras, Padre Gabriele Amorth, 2ª edição. Página 14. Ed. Palavra e Prece.

[2]  Achille M. Triacca, Anamnesis, Vol. VII

[3]  J. B. Russel, 4 volumes sobre o demônio. Editoras Mondadori e Laterza. A. Franz, bênçãos na idade média.

[4] Exorcistas e Psiquitras, Padre Gabriele Amorth, 2ª edição, 2006. Página 15. Ed. Palavra e Prece.

[5] Cf. 2 Pd 5,8 | Tg 4, 7 | 1 Jo 5, 18-19 | Ef 6, 12

[6] Apologia, VI, 5-6, Justino.

[7] Contra Demétrio, c. 15, Cipriano.

[8] Orígenes contra Celso.

[9] Até o Concílio Vaticano II havia a ordem do exorcistado. Os sacerdotes recebiam o ministério de exorcizar os possessos.

[10] 7 períodos históricos do exorcismo foram descritos com base no livro Exorcistas e Psiquiatras, Padre Gabriele Amorth, Ed. Palavra e Prece. 2ª edição, 2006. Também os estudos do Padre Franco Pierini, docente de Patrologia.

[11] Gaudium Et Spes, 37.

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