“Diga-lhe que está fazendo um bom trabalho!”

No último dia 12 de junho, domingo, foi o aniversário de uma pessoa muito especial para a Igreja do Brasil: Maria Gabriela, a quem carinhosamente todos chamamos de madrinha.

A madrinha completou 90 anos e as redes sociais foram inundadas com suas fotos com sacerdotes, fazendo homenagens com muito carinho e agradecendo a Deus pelo dom de sua vida. Uns, chamando de madrinha, outros de mãe, além da presença carinhosa do Padre Marcelo Rossi. Talvez, você não tenha ciência da importância de Gabriela para o ministério de oração por cura e libertação no Brasil e, por que não dizer, para o ministério do exorcismo em nosso país.

Durante mais de 30 anos, Gabriela foi a única pessoa na Igreja de São Paulo a quem se podia recorrer quando havia distúrbios espirituais. Historicamente, na Arquidiocese de São Paulo — a maior da América Latina —, não há um sacerdote nomeado para o sagrado ministério do exorcismo. Isso fez com que Deus, Nosso Senhor, abrisse uma outra possibilidade, derramando sobre a Gabriela um carisma muito especial de libertação, que não é dado para muitos. Após a confirmação de dois bispos — entre eles o decano do colégio cardinalício —, esse carisma veio a florescer e ajudar muitas pessoas que sofriam nas garras do demônio.

 

O dom libertação do demônio

 

Foi em uma das visitas que lhe fiz em sua casa, em São Paulo, onde tivemos uma longa conversa e eu pude lhe perguntar como foi que recebeu o carisma de rezar pela libertação das pessoas. Com muita simplicidade, ela me relatou:

 

“Na década de 80, com o advento da Renovação Carismática Católica, eu recebi esse dom. Participava ativamente da Igreja e um dia, fui convidada a participar de um Seminário de Vida no Espírito Santo. Naquela época, uma grande novidade, que não sabíamos muito bem o que era. Aceitei, mas não querendo muito ir e quando lá estava, após as pregações, no segundo dia, aconteceu o momento da efusão do Espírito Santo, em que se rezavam uns pelos outros, pedindo essa graça. Quando chegou a minha vez e foram rezar por mim, o meu corpo foi tomado por um calor incontrolável e eu arqueava igual o bambu de vara verde: ia para a frente e para atrás com a maior elasticidade. Aquele calor me dava uma falta de ar incontrolável e eu sabia que não era normal e alguma coisa estava acontecendo. Voltei para casa e a vida seguiu. Ainda naquela semana, uma pessoa da Paróquia estava acamada e precisa receber a visita de alguém da comunidade, a fim de ser animada na fé. Minhas coordenadoras disseram assim: ‘Gabriela, já que você está cheia do Espírito Santo, participou do retiro e tudo mais, por que você não vai visitar a dona Fulana?’ Aceitei na hora, sem imaginar o que estava por vir. Chegando lá, entrei na casa e fui até o quarto da pessoa que estava doente, para lhe fazer uma visita. Sempre fui muito expansiva com as pessoas e cheguei feliz para desejar a paz para aquela senhora doente, que sofria. Ao entrar no quarto, percebi algo estranho. A mulher estava na cama e começou a ranger os dentes e urrar, como se fosse uma animal pronto para me atacar. Nunca tinha visto aquilo antes, mas de repente, um conhecimento que não tinha invadiu a minha mente e me lembrei que eu carregava comigo uma medalha de Santo Antonio no peito. Ali, sem nenhum conhecimento prévio, mas cheia de coragem que não sei de onde vinha, peguei a medalha e coloquei na testa daquela senhora e começamos uma oração que não fazia ideia de como estava fazendo e de onde vinham as palavras. Foi a primeira vez que enfrentei o demônio. Depois disso, comecei a achar estranho, pois as pessoas vinham me abraçar para dar a paz de Cristo e caíam estateladas no chão. Naquele tempo, não tínhamos ninguém para ensinar, não tinham livros de gente entendida, como temos hoje. Eu fique muito assustada e pedi a Dom Joel, àquela época bispo da região Ipiranga, para me dar uma benção e tirar aquilo de mim. Ele, com toda a simplicidade de Pastor, me olhou bem e disse: ‘Gabriela, eu não posso fazer isso! Se Deus lhe deu esse dom é porque é da vontade Dele!’ Aos poucos, fui compreendendo que era a vontade de Deus.”

 

Um dom como esse é acompanhado de grandes responsabilidades. A partir dali, Gabriela foi sendo “aprimorada” por Deus para exercer este ministério. Passou a rezar pela cura e a libertação das pessoas e, para sua surpresa, foi se tornando conhecida, a ponto de até bispos e padres lhe enviarem casos. Foi, então, que apareceu uma segunda missão: rezar pelos sacerdotes.

Quando estive com ela, vi inúmeras fotos de padres em sua sala. Elas estão espalhadas numa estante, algumas nas paredes. São muitos padres, entre eles, alguns conhecidos: Padre Jonas Abib, Padre Marcelo Rossi, Padre Alberto Gambarini, Padre Serginho, Padre José Eduardo e até de celebridades. Nesse momento, ela percebeu que havia recebido uma missão muito especial:

 

“De tudo que me acontece, há algo especial: eu rezo para todos, mas quando eu rezo para padres, ah meu filho, me dá aquele chuimmmmm [1] na cabeça e o Espírito Santo me mostra na hora do que eles precisam. Certa vez, um padre me pediu oração. Ao rezar por ele, apareceu na hora na minha cabeça: ‘o salário do pecado é a morte.’ Fiquei muito sem jeito de falar aquilo para um padre e como tenho muito medo de revelações, aguardo sempre aparecerem para mim pelo menos três vezes, para ter certeza de que vem realmente de Deus. Então, comecei a conversar com o padre com muito jeito e expliquei-lhe que era necessário fazer uma boa confissão dos pecados. Alguns anos depois, estava rezando em outro local, quando me falaram que ali estava um padre em estado terminal, se eu não podia rezar nele. Ao ir até o sacerdote, tal foi a minha surpresa, quando encontro aquele mesmo padre pelo qual tinha rezado daquela vez, anos antes, nas últimas, falecendo em decorrência do vírus HIV.”

 

Descobrindo que estava errada e obedecendo a Santa Igreja

Na década de 80, Gabriela era uma das poucas pessoas no Brasil que rezava por libertação. O Cardeal Decano do Colégio Cardinalício, Dom Agnelo Rossi, a abençoou diversas vezes, desde que a conheceu, encorajando-a prosseguir naquele ministério e celebrando a santa missa com ela todas as vezes em que esteve no Brasil.  Mas como não havia formadores nessa área no Brasil — e nem exorcistas —, a madrinha não esconde de ninguém que cometia muitos erros, que eram supridos pela graça de Deus. Toda vez que aprendia o correto, logo passava a fazer o correto. Foi assim, por exemplo, quando descobriu que durante as orações de libertação não podia perguntar o nome do demônio:

“Todas as vezes que eu rezava, ordenava em nome de Jesus que o demônio dissesse o seu nome. Quando soube que havia uma instrução sobre exorcismo da Sagrada Congregação para Doutrina da Fé proibindo que isso fosse feito, imediatamente, parei com essa prática. Certa vez, estava orando numa pessoa e a ‘briga foi feia’! Chamei São Miguel, São Gabriel e São Rafael e toda corte celeste e em determinado momento, pedi: ‘Senhor Jesus, peço que expulse esta coisa que está aí!”. Na mesma hora o demônio virou para mim e disse: ‘Coisa não! Eu sou… e revelou ali o seu nome! (risos). A partir dali, como ele mesmo tinha dito quem era, quando rezava naquela pessoa, sempre pedia a Jesus que expulsasse o demônio fulano, dando o nome que este apresentou.” [2]

 

A benção do Padre Rufus: “diga-lhe que está fazendo um bom trabalho!”

A conversa com a madrinha é sempre um aprendizado espiritual. Ela sofreu muito, mas também sempre foi muito usada por Deus para libertar muitos irmãos que sofriam de graves problemas espirituais. Tudo isso, a fez tornar-se muito conhecida, inclusive de exorcistas internacionais, como foi o caso do saudoso Padre Rufus Pereira. No ano 2000, Padre Rufus estava no Brasil, para dar um retiro e soube do ministério de Gabriela. Ele logo mandou chamá-la para ir até a Comunidade onde estaria, pois queria conhecê-la, mas também vê-la rezando. Durante as orações que estava ministrando, duas garotas que eram irmãs gêmeas entraram em transe de possessão diabólica e foram levadas até o local onde a madrinha estava:

“Eu já estava esperta: na hora que as duas chegaram, eu peguei na parte detrás da cabeça delas, pelos cabelos, e comecei a rezar ali pela libertação. Fiquei surpresa em ver que o Padre Rufus não fazia nada, apenas me observava e tirava fotos. Ao final, pediu ao tradutor para me dizer: ‘diga a ela que está fazendo um bom trabalho! Fiquei muito sem jeito, pois era o Padre Rufus…”

 

O caso da serva no Congresso da RCC

Uma das coisas que eu sempre quis entender era porque a madrinha não rezava pelas pessoas, quando lhe pediam. Em uma conversa, pude perguntar-lhe o porquê disso e ela me respondeu com o testemunho abaixo:

“Certa vez, fui a um Congresso da RCC em Aparecida, SP. Ao chegar, passando pelo meio do povo, logo fui reconhecida. Ouvia as vozes das pessoas dizendo assim: ‘olha lá: é a Gabriela, que expulsa os demônios!’ Rápido, quis sair dali e me levaram para o melhor lugar que havia no local: a capela do Santíssimo. Fiquei ali sozinha, com Ele, e uma pessoa que era coordenadora da Secretaria Rafael [3] de uma Diocese aqui de SP, queria porque queria que eu rezasse nela. Eu disse-lhe que não podia rezar porque não sabia em que ‘becos ela tinha andado’. Mas ela insistiu tanto que cedi: levei-a para perto do Santíssimo, para rezar. Coloquei minhas mãos sobre ela e disse: ‘Senhor Jesus, dê a essa pessoa aquilo que é mais necessário na vida dela!”. Ah meu filho! Foi um Deus nos acuda! A mulher, coordenadora da Secretaria Rafael da RCC, começou a passar mal, gritar e se debater e eu ali sozinha, comecei a chamar os anjos, São Miguel, São Gabriel, São Rafael. A mulher foi se acalmando, até voltar ao seu estado normal. A partir dali, nunca mais rezei por ninguém sem conhecer, fazer a logoterapia. Nada!”

 

Um dom de palavra de ciência aguçado

 

As pessoas que procuram ajuda para quem sofre, muitas vezes, descuidam-se de si mesmas. Não é incomum que ao encontrar um caso de problema espiritual, verifiquemos que na verdade é outra pessoa que está precisando de ajuda e não aquela que desejam que rezemos. Certa vez, contou a madrinha:

“Trouxeram uma criança de colo, que veio com a mãe e o marido. Na sala de casa, onde atendia, a mãe foi me contando a história, pois não fazia nenhuma oração sem ouvir primeiro do que se tratava, fazer a logoterapia. Enquanto ela falava, fui levada a tirar a criança do seu colo e dar para o pai segurar. Foi o Espírito Santo já me movendo para o que ia acontecer. Comecei a oração pelo menino e a mãe caiu em surto maligno [4] aos meus pés, com o demônio berrando absurdos diante de todos.”

 

A experiência da Maria Gabriela e muito do seu testemunho está no livro “Combatendo o bom combate: orientações para cura e libertação”, da editora Palavra e Prece.

 

Referências e notas

[1] Expressão usada por ela para designar a palavra de ciência, dom sobrenatural de conhecimento do Espírito Santo, onde revelações sobrenaturais acontecem com a pessoa que o recebe.

[2] Na formação dada na Diocese de Campo Limpo, SP, no ano de 2009.

[3] A Secretaria Rafael era o nome que davam ao Ministério de Oração por Cura e Libertação da RCC.

[4] No tempo em que madrinha rezava pelas pessoas, era muito perseguida quando usava a expressão “possessão diabólica”. A fim de não criar problemas com a Igreja, ela passou a dizer que as pessoas entravam em surto maligno quando rezava por elas.

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