O Cônego Benedito Ramon Pinto Ferreira é o sacerdote exorcista oficial da Arquidiocese de Pouso Alegre, MG. Um dos poucos sacerdotes autorizados a celebrar exorcismos em todo estado de Minas Gerais, hoje ele completa 30 anos de ordenação sacerdotal. De prosa fácil, amável e bem disposto, conversou conosco num tom bem-humorado sobre os seus 30 anos de padre e os desafios de ser o exorcista oficial arquidiocesano.
Portal: Hoje, o senhor completa 30 anos de ordenação sacerdotal. Como se sente sendo sacerdote há tanto tempo?
Cônego Benedito Ramon: “Trinta anos de ordenação sacerdotal. O tempo passa muito rápido. A vida é muito rápida. E eu tenho um lema comigo: “a graça de Deus é como o dia de ontem, não volta mais.” Hoje, olhando pra trás sinto duas questões: primeiramente, a alegria de poder ter sido sinal e instrumento de Deus, mas no fundo também alguma tristeza de nem sempre ter sido aberto plenamente a graça de Deus. Apesar de tudo, com trinta anos de padre, não tenho mais idealizações, passei a viver a realidade. Não crio fantasias. Perdi essas idealizações, mas não perdi o encanto. Então, é uma caminhada de altos e baixos, alegrias, tristezas, mas onde relendo a gente percebe a graça de Deus, o colo de Deus a vida inteira.”
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Portal: O que mais o marcou nesses 30 anos de sacerdote?
Cônego Benedito Ramon: “É difícil colocar um momento que marcou mais nesse tempo de padre. No meu caso, como padre diocesano, é cada paróquia um recomeçar. Eu sempre gosto de ver a eterna novidade de Deus, então falar que “momento especial” é muito complicado. Existiram vários momentos em que eu percebia com objetividade a graça de Deus, mas o momento exato, várias vezes, Deus me surpreendeu e continua surpreendendo.”
Portal: Há pouco tempo, o senhor recebeu a licença do arcebispo para celebrar exorcismos. Como se sentiu chamado a esse ministério tão delicado?
Cônego Benedito Ramon: É, foi interessante a minha história: já havia um padre que há muitos anos atrás, aqui na nossa arquidiocese de Pouso Alegre, embora não tinha um envio, a licença específica do bispo, fazia os trabalhos e eu ficava não só na área como exorcista, mas cuidando dessas questões da pastoral da consolação. Muitas pessoas doentes, questões psíquicas. Então ele estudou muito psicologia, entrou muito nesses campos e ele sempre falava pra mim: “olha, tem que atender essas pessoas!”. Então, a vida inteira cuidei disso e eu lembro muito bem que em uma determinada pessoa ele impôs as mãos e rezou e a pessoa teve uma grande melhora, uma coisa impressionante! Então, eu olhei para ele e falei: “Monsenhor, olha, agora essa eu não entendi – eu era estudante de filosofia – essa eu não consegui entender o que aconteceu, essa cura só com a energia das mãos? O que aconteceu?” Era um velhinho de noventa anos, ele deu um tapinha no meu rosto e falou: “É dose dupla, meu filho.” Eu fiquei na minha.
Quando eu fiquei padre, ele estava presente, beijou minhas mãos e falou: “Agora, você também pode usar dose dupla né? A energia das mãos, mas a graça e a eficácia do sacerdócio.” Então, tive esse privilégio de crescer com santos, isso foi muito bom! E eu fazia o atendimento já desde o meu segundo ano de padre, mais na área psicológica. Tanto, que eu fui estudar essas perspectivas e agora, com o novo arcebispo (o antigo arcebispo, Dom Ricardo, faleceu e com ele as permissões para exorcismo eram ad hoc; eu ligava pra ele, conversava e ele falava “pode ir meu filho, está autorizado pra esse caso”), ele quis fazer algo mais concreto e então pediu que eu fizesse o curso e em seguida, me associasse a Associação Internacional dos Exorcistas para estar junto com os exorcistas do Brasil. Então, é sempre uma eterna novidade da parte de Deus.
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Portal: Nesses 30 anos de sacerdote, o que acha que tem sido o trunfo do demônio para perder as almas?
Cônego Benedito Ramon: A primeira questão é essa: o demônio é muito esperto e, às vezes, a gente esquece disso e onde a gente pensa que ele está, não está. A maioria das pessoas pensam que sabem onde ele está, mas ele não está e vice e versa. Essa é uma questão primordial. Eu vejo o demônio como um enganador e essa abertura para enganar, os meios de comunicação e o nosso mundo do jeito que estão indo, torna-se complicada.
As pessoas estão achando a graça de Deus desnecessária, querem caminhar do seu jeito, a famosa religião “fast food” onde “isso eu quero”, “isso aqui, eu não quero”. “Batizar meus filhos, eu quero”, agora “casar na igreja, não”. “Confessar eu acho bobagem, comungar eu vou”. Então, a ação do maligno acontece de uma maneira tremenda! As pessoas vão abrindo as portas e fica cada vez mais complicado. Vamos atender casos que ficamos confusos até. Você ouve, entende e pergunta: você quer mudar de vida? A pessoa olha para nós e fala: “ah, não sei.” Então, a situação foge ao normal: como é que você vai fazer uma oração, oração de libertação, se a pessoa não quer ser liberta?Precisamos rezar mais! Todos nós.
Portal: As pessoas acreditam que o exorcista possui “poderes especiais”. Como é a vida de um sacerdote exorcista?
Cônego Benedito Ramon: É esse o problema e é muito grande: as pessoas acharem que o padre exorcista tem linha direta com o céu, o celular de Deus. Então, não é por aí! É um problema e há um perigo muito grande pra nós também, de cair no orgulho e começar a “se achar”. Nós vemos algumas pessoas que se dizem exorcistas – até podem ter permissão do bispo, não sei, não posso julgar -, mas acabam virando “estrelas” e não é esse o nosso trabalho. Nosso trabalho é estar ali exercendo a capacidade consolação. Eu adoro esse termo: o ministério do exorcista se exerce numa pastoral da consolação. As pessoas sofridas que encontramos, a capacidade que temos de chorar junto com as pessoas que choram, sorrir junto com elas. A maioria das pessoas que nos procuram não encontram alguém, um padre que compreenda, que acredite, que oriente, que saiba falar que a pessoa não tem nada demoníaco, mas com jeito, com tranquilidade. Os outros exorcistas que tenho contato relatam a mesma coisa. A pessoa não tem nada de demônio, mas ela pode ter várias questões físicas, psíquicas, sofrimentos, e quando você chega e fala para ela, é uma boa notícia: “Olha, você não tem nada demoníaco, não está com você, mas eu estou sentindo que Deus está!” A pessoa não quer outra coisa, apenas uma palavrinha nossa. Eu gosto muito de Santa Tereza d’Ávila e uma coisa que ela fala para as monjas é que elas nunca se iludam, porque nós somos como “ouro de tolo”. Todo mundo pensa que é ouro, mas a gente sabe que não é nada. Então, nós exorcistas, temos que ter consciência dessas coisas, temos que tomar muito cuidado para não cair no orgulho. Senão, quem será o primeiro a ser pêgo pelo demônio somos nós mesmos.
Portal: Por que é importante que haja um exorcista nas dioceses?
Cônego Benedito Ramon: O exorcista na diocese é importante não só para os casos da ação extraordinária do demônio, mas para que as pessoas tenham um referencial. Todo ser humano precisa de um referencial forte! Hoje, estão tirando nossos referenciais: da família, da escola, do estado não é? Até da igreja. São tantas coisas. Então nós precisamos de um referencial. O padre exorcista é um referencial, não por méritos dele. Nós não somos nada, mas por envio, por graça de Deus, por fazer parte dessa igreja maravilhosa que é a nossa igreja, vamos poder rezar com as pessoas que precisam, que necessitam do nosso auxílio específico. Isso é maravilhoso, é uma coisa muito gratificante podermos ser sinal da presença, do amor de Deus, do Deus misericordioso pra essas pessoas e pra nós também.
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Cônego Benedito Ramon: O senhor esteja convosco, ele está no meio de nós! E que desça sobre todo o povo de Deus, a benção da paz, do amor, do perdão, da saúde, a benção de Deus todo poderoso, Pai, Filho e Espírito Santo. Amém! Rezemos uns pelos outros!
