O dom de cura e o ministério confiado por Jesus

A partir o capítulo 12 de sua primeira carta à comunidade de Coríntios, São Paulo dedica um largo espaço para falar dos chamados carismas e dons espirituais. O Espírito Santo, alma da Igreja, faz surgir nela e para ela diversos ministérios e operações!

O Catecismo da Igreja Católica no § 2003 vai definir os carismas como “graças especiais (…) segundo a palavra grega empregada por S. Paulo e que significa favor, dom gratuito, benefício. Seja qual for seu caráter, às vezes extraordinário, como o dom dos milagres ou das línguas, os carismas se ordenam à graça santificante e têm como meta o bem comum da Igreja. Acham-se a serviço da caridade, que edifica a Igreja”.

O Espírito Santo doa os carismas para a evangelização – como se vê tantas vezes em Atos dos Apóstolos – e com o fim de edificar a Igreja. Utilizar os carismas, além de um mandato de Jesus (Mt 10,1-16; Mc 16,15-18; etc) é um ato de caridade para com aquele que está sofrendo.

Os Evangelhos estão repletos de testemunhos de curas, milagres e libertações operados pelo Senhor Jesus em Sua vida pública. Ele está vivo e continua a operar na Sua Igreja por meio daqueles que se dedicam ao Seu seguimento!

São Paulo, em sua epístola, elenca 9 carismas e alguns autores os dividiram em três grupos:

  • Dons de Inspiração;
  • Dons de Conhecimento e/ou Revelação;
  • Dons de Obras e Poder.

Hoje te convidamos a meditar um pouco sobre um dos dons mais presentes no Ministério de Jesus: o dom de cura.

 A doença e a cura, sinal do Reino de Deus:

Desde o primeiro homem criado até os tempos de hoje, o ser humano é atravessado pela dor, o sofrimento e a enfermidade. Acontece um confronto diante da finitude da sua existência e ele é desafiado pelos seus próprios limites e fraquezas. No entanto, o homem criado não está fadado ao fracasso ou ao derrotismo; Cristo encarnou-Se, morreu e ressuscitou para dar-lhe uma nova vida. Deixou na Sua Igreja a força da qual o ser humano precisa para dar passos firmes e para a felicidade e deixando a Si mesmo, através dos Sacramentos.

Os sofrimentos da humanidade não estão ocultos aos olhos de Deus. São João, no capítulo 5 do seu Evangelho, narra a cura do cego de nascença que Jesus realiza no Shabbat, movido unicamente pela compaixão. O Senhor revela o plano do Pai que “trabalha sempre” (Jo 5,9). O Pai não perde uma oportunidade de nos conduzir à salvação e, mesmo em meio aos nossos sofrimentos e dores, deseja nos acalentar com o Seu Amor!

Jesus, em Seu ministério público, realizou muitas curas e sinais movido pela compaixão por aqueles que sofrem, confiou a mesma vocação aos Seus discípulos e a nós nos dias de hoje. Ele, que curou os paralíticos e cegos e libertou os oprimidos pelo demônio é o mesmo ontem, hoje e sempre; está vivo e, por este motivo, continua a realizar e operar hoje! Basta que estejamos disponíveis e O deixemos operar em nós e através de nós pois o Evangelho é bem claro:

“Curai os enfermos!”.

O ministério de orar por cura é um serviço de amor e compaixão para com aquele que sofre. É o ministério de Jesus, pois foi o que Ele mais realizou enquanto estava caminhando entre os Seus. O Espírito Santo distribui os Seus dons e carismas da forma que Ele achar melhor e a quem Ele quiser, e estes não podem ser apreendidos ou engaiolados. Em cada tempo, Nosso Senhor levantou luzeiros: homens e mulheres de oração – contemporâneos ou não – que consumiram as suas vidas por amor a Jesus e aos irmãos e que, por causa desse mesmo amor, realizaram várias curas e sinais: São Bento, São Francisco de Assis, São Bruno, São Domingos, São Padre Pio, São Charbel, Tia Laura, Teresa Newman, Servo de Deus Padre Léo, Servo de Deus Padre Gilberto e tantos mais.

Homens e mulheres que não tiveram medo de “quebrar a cara” por Jesus, se fosse necessário, e que se dispuseram a aliviar os sofrimentos alheios, mesmo arriscando suas próprias vidas. Estes homens e mulheres de Deus doaram a própria vida, o próprio cansaço para que outros descansassem e fossem curados.

No ano 2000 o então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Card. Ratzinger, autorizou a publicação do documento “Instrução sobre as orações para alcançar de Deus a cura” no qual, com muito zelo, escreve sobre a visão da doença para a Igreja e o enfermo, necessitado da cura. Indica que a doença também é um meio para a oração: seja de conformação à Divina Providência que a tudo dispõe para “o bem dos que O amam” (cf. Rom 8,28) ou para suplicar a Deus a cura para tal enfermidade. Essa forma de orar sempre esteve presente na vida da Igreja e continua nos dias de hoje; no entanto, para que se evitem alguns abusos, achou-se por bem oferecer ao povo de Deus e aos pastores o referido documento.

A doença, como elucida o documento em questão, mesmo tendo esse caráter unitivo à vontade de Deus ou de conversão, ainda continua a ser um mal – que bate também à porta do justo que, através dela, confirma-se em justiça e retidão como acontece com Jó que, mesmo provado, permanece fiel aos seus princípios de fé. Jesus encontra-se com doentes não de forma casual, mas constante – e estas curas “manifestam a vitória do Reino de Deus sobre todas as espécies de mal e tornam-se símbolo do saneamento integral do homem, corpo e alma”. (Cf. Instruções para alcançar de Deus a cura, aspectos doutrinais)

Estes sinais e prodígios, prometidos em Mc 16,17-18, eram testemunhados nas comunidades por meio da pregação do Evangelho e não estavam ligados somente à figura dos apóstolos, mas aos fiéis na prática da evangelização.  

Nos Evangelhos, vemos que o Senhor Jesus, movido pela compaixão, escuta atento ao clamor daquele que pede por cura e libertação; várias passagens das Sagradas Escrituras estão recheadas de pedidos dos salmistas por saúde, paz, prosperidade. A postura de Jesus diante desses pedidos não era de reprovação ou negação para com aquele que clamava, mas como nos ensinou o Card. Ratzinger “a única queixa do Senhor refere-se à eventual falta de fé” e aqui podemos lembrar das palavras de Jesus à sua amiga Marta “Eu não lhe disse que, se acreditar, você verá a Glória de Deus?” (Jo 11,40)

Nosso Senhor tem um amor especial com aqueles que sofrem. Tanto é que confiou à Igreja um Sacramento que Lhe pede a saúde aos enfermos, chamado de “Unção dos enfermos”. A cura é o anúncio da Ressurreição, da Vitória Definitiva de Cristo, que vence a todo mal, dor e luto (Ap 21,4).

Evangelização, cura e confirmação da Missão:

Nas passagens já mencionadas (Lc 10; Mt 10) o Senhor manifesta esses carismas para autenticar a missão dos enviados, não para uma promoção pessoal. Ou seja, os sinais que o Senhor Deus quiser manifestar durante a pregação do Evangelho não são para benefício próprio, mas para confirmar a Palavra anunciada. Infelizmente, o que vemos acontecer é uma institucionalização do próprio Espírito Santo e dos Seus dons! Não é possível “engaiolar” a Deus, como nos ensina o Papa Francisco.

Os dons do Espírito são distribuídos “conforme Lhe apraz”, como diz São Paulo, e são comunicados da forma que Ele quiser a quem quiser. Não são instrumentos para glorificação do homem. Já nos Atos dos Apóstolo, podemos ver no cap. 8, 14-26, a atitude de Simão que oferecera dinheiro aos apóstolos em troca do “poder” do Espírito Santo. Atitudes como essa de Simão, infelizmente, ainda podem ser vistas em nosso meio: pessoas a quem o Senhor agraciou com tais dons vendendo os seus serviços, enquanto Nosso Senhor disse “Vocês receberam de graça; deem de graça.” (Mt 10,8).

O número 5 do Documento muito bem elaborado e de fácil entendimento da Doutrina da Fé faz uma diferenciação entre o que se entende hoje como carisma de cura e as curas presenciadas em Santuários ou alcançadas pela intercessão dos santos. Diz o documento:

“Para que possam estar ligadas a um eventual carisma, é necessário que nelas [nas curas] sobressaia, como elemento determinante para a eficácia da oração, a intervenção de uma ou várias pessoas, individualmente ou de categoria qualificada, por exemplo, os dirigentes do grupo que promove a reunião”, isto é, para que seja constatado que se trata de um carisma de cura, é preciso que haja a oração de uma pessoa ou várias nessa intenção. De forma muito clara também, explica-se que o Carisma não se atribui a determinada pessoa; em reuniões de oração que tenham como objetivo pedir a Deus a cura “dever-se-ia confiar apenas na vontade totalmente livre do Espírito Santo, que dá a alguns um especial carisma de cura para manifestar a força da Graça do Ressuscitado”. A Graça, como já dito, não pertence a grupos ou movimentos; é o Espírito Santo que age conforme Lhe apraz (1Cor 12,11)

“Há que recordar, por outro lado, que nem as orações mais intensas alcançam de todas as doenças”, explica o Card. Ratzinger, embasado no que disse o Senhor a São Paulo: “basta-te a Minha graça” (2Cor 12,9). Aquele que ora pedindo ao Senhor a graça da cura deve atentar que Deus sempre sabe o que é o melhor e que não são a força ou a beleza das nossas palavras que irão “arrancar” de Seu Coração a saúde para um enfermo; talvez o plano de Deus seja outro, por isso, rezamos sempre no Pai-Nosso “seja feita a Vossa vontade” e sempre que oramos “em Nome de Jesus”.

A Igreja é Mãe que orienta:

Na última parte do documento, dispomos de 10 artigos que norteiam as orações com intenção de cura (sejam estas litúrgicas ou não), cujo nº 9 diz: “Os que presidem às celebrações de cura, litúrgicas ou não litúrgicas, esforcem-se por manter na assembleia um clima de serena devoção, e atuem com a devida prudência, quando se verificarem curas entre os presentes. Terminada a celebração, poderão recolher, com simplicidade e precisão, os eventuais testemunhos e submeterão o fato à autoridade eclesiástica.”

Deus sempre age com simplicidade e serenidade, como aconteceu com Naamã, que esperava um “show” por parte do Profeta Eliseu, mas recebeu um “banho” no Jordão – ou melhor, sete! – como condição para a cura. Recordamos que nessa passagem (2 Reis 5), a Igreja vê nos sete mergulhos de Naamã, consumido pela lepra, os sete sacramentos doados por Jesus para a cura das nossas almas. Os sacramentos são fontes de cura e salvação, remédio para nossas almas e libertação dos nossos pecados!

Testemunho:

Recordo-me que certa vez, em uma reunião de oração, clamávamos a Efusão do Espírito Santo e havia uma pessoa que estava com um calo ósseo que causara uma má formação em um de seus pés, fratura essa que foi consequência de um acidente e que já há muito tempo lhe trazia dificuldades para locomoção. Durante a oração, fomos movidos a pedir ao Senhor a cura de tal pessoa e acreditamos que, se essa fosse Sua vontade, Ele a curaria: realizamos uma oração de perdão – a falta de perdão pode ser um obstáculo para que as curas aconteçam – e suplicamos ao Senhor que concedesse àquela pessoa o Dom do Espírito Santo e, por meio deste, um profundo encontro com o Ressuscitado que pela Sua Vitória na Cruz carregou Consigo nossas dores e derrotou o maligno. Era Ele e somente Ele que poderia curar aquela pessoa.

Terminada a oração de súplica, simples e realizada em Nome de Jesus, abandonados em Sua vontade, louvamos a Deus reconhecendo que Sua vontade era soberana sobre tudo e todas as coisas. No dia seguinte, recebemos a notícia de que a mesma pessoa já acordara sem dor e que, depois de muito tempo, conseguiu colocar o pé no chão, ação que já não conseguia fazer sem lhe causar muita dor. E para a maior glória de Deus, essa pessoa ficou completamente curada!

Louvados sejam Nosso Senhor Jesus Cristo e Sua Mãe Maria Santíssima!

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